Sem instrução, crianças já sabem aritmética.
Jovens no jardim da infância já fazem somas e subtrações aproximadas com números.
Estudo britânico e americano aponta formas de aperfeiçoar técnicas de aprendizado.
O "cálculo" fica próximo do que, entre os adultos, convencionou-se chamar de "chutômetro". Mas os testes, feitos com crianças de 5 e 6 anos, mostram que a chance de acerto é bem maior do que a que seria esperada por um "chute" calibrado apenas pela sorte.
A pesquisa foi realizada por um trio de pesquisadoras encabeçado por Camilla Gilmore e está publicado na edição desta semana do periódico científico "Nature".
Claro que nenhuma das cientistas pediu à criançada que resolvesse cálculo diferencial. Na verdade, os exercícios que serviram aos testes eram relativamente simples e exigiam apenas que os jovens realizassem somas ou subtrações aproximadas e comparassem o resultado com algum outro número. Um exemplo de problema: "Sarah tem 21 doces. Ela ganha mais 30. John tem 34 doces. Quem tem mais doces, Sarah ou John?"
Embora essas crianças jamais tenham sido instruídas sobre como somar as duas quantidades por meio dos símbolos que as representam, elas parecem ser capazes de "fazer uma idéia" de quanto a soma vai dar, a ponto de comparar o valor com um outro número. Isso ficou claro para as pesquisadoras quando elas constataram que os jovens acertavam quem tem mais doces, Sarah ou John, em cerca de 65% das vezes. O esperado, se o palpite da molecada fosse completamente aleatório, seria uma taxa de acerto de 50%.
Naturalmente, trabalhar com algarismos ainda é mais difícil para essas crianças do que lidar com representações mais intuitivas de quantidades. Testes que realizavam as mesmas operações aritméticas, mas apresentavam as quantidades como simples pontos numa tela (em vez de números), tiveram taxa de acerto superior a 70%.
As pesquisadoras procuraram eliminar qualquer viés que pudesse advir do nível social da criança testada, entrevistando o maior espectro possível de jovens. Eles constataram que a taxa de sucesso não sofria influência significativa da proveniência familiar.
O que influenciava mais os resultados, na verdade, era a capacidade da criança de se concentrar no problema. Na tranqüilidade do laboratório, com paredes brancas e baixo nível de ruído, o nível de acerto ia aos 65%. Já numa sala de aula normal, com toda a decoração e o barulho em volta para distrair, o sucesso caía para 63,9%.
Para as cientistas, o estudo não é mera questão de ver até onde a turminha do jardim da infância pode ir fazendo contas sem ter aprendido formalmente como lidar com números. Ao realizar esse tipo de experimento, o trio espera ajudar no desenvolvimento de técnicas mais eficazes de aprendizado.
"Nossos achados ajudam a delimitar as fontes das dificuldades das crianças de aprender aritmética simbólica e sugerem modos de melhorar o interesse infantil pela matemática formal", escrevem Gilmore e suas colegas. Ou seja, graças a esse tipo de pesquisa, talvez as próximas gerações não fiquem tão ansiosas para encontrar desculpas para não fazer a lição-de-casa, no fim das contas.
Salvador Nogueira
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