Brasil entra na caça ao gráviton.


A antena Mario Schenberg tentará capturar uma das partículas mais misteriosas da natureza.

Carlos Orsi

Divulgação
Detalhe da antena esférica
Mario Schenberg

SÃO PAULO - Uma esfera metálica, munida de sensores e equipamento eletrônico de última geração, mantida no vácuo e a uma temperatura que pode se aproximar do zero absoluto, representa a importante contribuição brasileira no esforço mundial para desbravar uma principais das fronteiras da ciência moderna: a detecção de ondas gravitacionais.

Batizada "antena Mario Schenberg", em homenagem ao grande cientista brasileiro, a esfera, mantida no Instituto de Física da USP, passou por um período de testes e calibragem em setembro. Ela é como um sino que precisa ficar absolutamente imóvel - daí o vácuo e a temperatura baixa - esperando para oscilar ao impacto de uma partícula que nunca foi vista, mas é importantíssima nas teorias e cálculos científicos: o gráviton.

De acordo com a Teoria da Relatividade Geral, formulada por Albert Einstein há quase 100 anos, toda matéria, como estrelas e planetas, deforma o espaço onde se encontra. Ao se mover, esses objetos transmitem deformações sob a forma de ondas, como um atleta pulando numa cama elástica. Deformando o espaço, essas ondas podem, literalmente, tornar distâncias mais curtas ou mais longas, à medida que passam. Embora a Relatividade Geral já tenha sido confirmada por diversos experimentos, as ondas gravitacionais, especificamente, nunca foram detectadas de forma direta.

"Ondas gravitacionais produzem normalmente deformações, no espaço na vizinhança da Terra, que só modificariam o comprimento de um metro de uma porção menor que um milionésimo do diâmetro de um núcleo atômico", explica o principal investigador do Projeto Gráviton, responsável pela antena Mario Schenberg, Odylio Aguiar, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). "Os desafios tecnológicos para se medir isto são enormes".

Lasers

A antena brasileira não é o único projeto a tentar detectar ondas gravitacionais. Nos EUA, existe o projeto Ligo (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory) que consiste de dois laboratórios onde raios laser são continuamente refletidos a partir das extremidades de corredores, dispostos em forma de "L", cada um com 4 km de comprimento. O objetivo do Ligo é detectar a passagem de uma onda gravitacional a partir de uma alteração na distância percorrida pelos lasers.

Aguiar diz que o Mario Schenberg provavelmente não será o primeiro experimento a detectar uma onda gravitacional - esse feito ficará a cargo de equipamentos como o Ligo - , mas a antena esférica contribuirá para a primeira detecção em que a direção e o formato da onda poderão ser determinados: isso porque a antena esférica tem seis transdutores - aparelhos para captar e medir a deformação da antena provocada pela onda - um conjunto que gerará os dados necessários para calcular de onde ela veio. Projetos como Ligo contam com apenas um detector.

Onda e partícula

A antena esférica também tem a vantagem de permitir que os cientistas tentem caracterizar o gráviton, que é a partícula associada, pela Mecânica Quântica, à onda gravitacional. De acordo com a física quântica, partículas como o fóton (a partícula da luz) e o elétron podem também se comportar como ondas, e ondas - como as gravitacionais - podem exibir comportamento de partícula.

"Assim como o fóton, o gráviton é uma partícula dual. Pelo menos acreditamos que seja", explica Aguiar. "Ele deve ter o comportamento ondulatório, variando as distâncias entre espelhos (princípio de funcionamento do Ligo), assim como o comportamento corpuscular, sendo absorvido, como um pacote de energia, por uma antena esférica".

A antena brasileira testará essa idéia: "O nome Gráviton, do grupo brasileiro, vem do fato que utilizamos uma técnica que poderá dizer alguma coisa sobre se a energia absorvida da onda gravitacional pode ser feita em qualquer quantidade ou se realmente, como prevemos, deverá ser feita em uma quantidade de energia múltipla de um valor mínimo".

O Projeto Gráviton surgiu em 1991, mas só começou a receber financiamento em 2000. A antena Mario Schenberg fez sua primeira "corrida" de 120 horas em setembro deste ano.

Os dados levantados nessa fase serão usados para ajustar e calibrar o detector para a fase científica do projeto que, segundo Aguiar, deverá ter início em 2007. Existe uma outra antena esférica no mundo, o MiniGrail holandês, que está em testes desde 2004 e talvez entre em fase científica ainda neste ano.