Astrônoma faz lista de astros com mais potencial para vida

REINALDO JOSÉ LOPES
Enviado especial a St. Louis

Duas estrelas que são visíveis a olho nu no céu do hemisfério Norte devem ganhar um bocado de atenção dos cientistas que tentam achar vida, quem sabe até do tipo inteligente, fora da Terra. Segundo uma astrônoma americana, elas parecem ser as melhores candidatas a ter, girando ao seu redor, planetas com condições favoráveis ao surgimento de plantas, animais e até civilizações fora do Sistema Solar.

Margaret Turnbull, da Instituição Carnegie de Washington, apresentou as estrelas como líderes de duas listas de astros com alta probabilidade de abrigar vida, durante o encontro anual da AAAS (Associação Americana para o Progresso da Ciência), que termina hoje em Saint Louis.

A primeira lista deve ficar sob a mira dos radiotelescópios da Terra: para a pesquisadora, não é impossível que por lá existam planetas com civilizações tecnologicamente avançadas, as quais poderiam estar enviando sinais de rádio para o espaço neste exato momento, revelando sua existência.

A segunda lista de estrelas pode até não incluir sociedades tecnológicas ou mesmo espécies inteligentes, mas, para Turnbull, tem chances de contar com vida em seus respectivos planetas. Portanto, merece ser bisbilhotada por uma nova geração de telescópios espaciais.

A virtude está no meio

O estado atual do conhecimento sobre o quão comum é a vida na Via Láctea ou no resto do Universo pode ser resumido numa frase: ninguém tem a menor idéia. Mas um ponto de partida bem razoável é começar a busca em estrelas que se pareçam mais com o Sol em termos de massa e idade, já que, afinal de costas, pelo menos ao redor dele o fenômeno apareceu com certeza.

"O centro da minha pesquisa foi a probabilidade de uma boa zona habitável ao redor da estrela", conta Turnbull. Dá para definir essa região como o lugar onde os planetas são capazes de abrigar água líquida, essencial para qualquer forma de vida conhecida -nem quente demais a ponto de fazer evaporar a substância, nem fria a ponto de congelá-la.

Para que uma estrela conte com uma zona habitável decente, uma das necessidades é a estabilidade gravitacional à sua volta --ou seja, ela não pode ficar sofrendo influências imprevisíveis de outras estrelas próximas, as quais provavelmente catapultariam os pobres planetas ao seu redor para onde Judas perdeu as botas.

Estabilidade, porém, não é tudo. "O tempo também é essencial. Afinal, sabemos que a Terra precisou de 4,5 bilhões de anos para que uma espécie desenvolvesse a tecnologia do rádio", diz Turnbull. A "nota de corte" que a astrônoma definiu em termos de tempo foi uma idade de 3 bilhões de anos ou mais para as estrelas --no caso da lista com possíveis sinais de rádio.

Nenhuma estrela também devia ter mais que 1,5 vez a massa do Sol, porque os astros mais pesados que isso tendem a ser menos lentos e estáveis em sua evolução.

Finalmente, outro fator importante para as "habstars" (ou "estrelas habitáveis") em ambas as listas é a chamada metalicidade --mais ou menos equivalente à porcentagem de ferro e outros metais pesados em sua composição. Isso porque a presença do elemento indica que a composição do sistema planetário em questão é diversificada o suficiente para permitir o florescimento da química da vida.

"Claro que a definição é centrada no nosso Sol", admitiu Turnbull. "Mas é o único jeito que temos de inferir sobre a vida em outros lugares por ora." Para a pesquisadora, "esses são os lugares onde eu gostaria de viver se Deus decidisse mudar a Terra de sistema solar".

E as vencedoras são...

Encabeçando a primeira lista, a dos sistemas estelares que talvez já sejam tecnológicos, está a estrela beta CVn, na constelação dos Cães de Caça ("CVn" é a sigla para o nome latino da constelação, "Canes Venatici"). Trata-se, claro, de um astro do mesmo tipo que o Sol, a 26 anos-luz da Terra. Esse primeiro "top five" também inclui estrelas de sistemas binários (ou seja, seus planetas teriam dois sóis), como a número 2, HD10307. E a quinta colocada, 51 Pegasus, já teve um planeta gigante gasoso detectado a seu redor. "Creio que ela poderia ter também planetas como a Terra na zona habitável, ou luas desse gigante gasoso que estariam nessa região", avalia ela.

A segunda lista elenca alguns dos alvos principais para a missão TPF ("Buscador de Planetas Terrestres", na sigla inglesa), um telescópio espacial que decolaria em 2014. O objetivo da missão é captar diretamente a luminosidade desses planetas distantes, coisa duríssima de fazer.

Por isso, as estrelas dessa lista são um pouco menos luminosas que o Sol, para facilitar tal serviço. A vencedora, segundo os critérios de Turnbull, é a epsilon Eridani, ligeiramente menor e mais fria que o Sol e localizada a cerca de 10,5 anos-luz da Terra, na constelação do Rio Eridano.

O TPF deve buscar, na luz refletida pelos planetas, a assinatura de substâncias fortemente associadas com a vida, como o oxigênio produzido por plantas ou o metano gerado por bactérias.

Boas e más notícias

Para trabalhar com a primeira lista, as perspectivas parecem boas. Durante a mesma sessão científica, a astrônoma Jill Tarter, do Instituto Seti ("Busca por Inteligência Extraterrestre", na sigla inglesa), anunciou que um novo conjunto de radiotelescópios, o Allen Telescope Array, deverá começar a operar na metade deste ano, usando 350 antenas. "Isso deve aumentar nossa capacidade de busca em centenas de vezes", diz Tarter, que serviu de inspiração para Carl Sagan na criação da protagonista do romance (e depois filme) "Contato".

Tanto ela quanto Turnbull, no entanto, criticaram muito o último orçamento da Nasa, que cortou em cerca de 50% os investimentos em astrobiologia (estudo da vida no Universo). "Eles praticamente mandaram a missão TPF para a gaveta", diz Turnbull.